Começamos o Verberenas em 2015 por sentir uma falta de espaço para os diálogos que nos interessavam e as questões que nos moviam. Em 2017, percebemos que o caminho mais interessante seria possibilitar encontros de ideias em que as nossas colaboradoras não tivessem restrições para falar do que as movesse. A partir desse impulso, convidamos realizadoras que tornaram essa primeira e imprevisível leva de textos ao mesmo tempo coesa e diversa. É o que publicamos agora em janeiro de 2018.
Tivemos a oportunidade de ler, editar e agora publicar todos esses textos como o Uma memória poética da carne, de Everlane Moraes, um relato profundamente íntimo sobre a sua experiência de fazer cinema. Já Lygia Pereira relaciona em seu texto, a partir de uma perspectiva pessoal, sensível e conectada, esses fazeres autônomos à realidade do sistema de imagens ao qual somos apresentados diariamente pela grande mídia. O texto de Bárbara Cabral produz notas que sugerem uma ligação entre vínculos femininos nos filmes de Marília Rocha, Renata Pinheiro e André Novais. Glênis fala do contexto dos festivais brasileiros em seu texto sobre Subybaya e Baronesa, e apresenta um segundo texto mais amplo que parte de reflexões sobre a animação brasileira Irmão do Jorel. Letícia relaciona espiritualidade e cinema em seu texto sobre o tempo em Mulher do Pai, enquanto Amanda propõe a questão de filmar o inimigo por um olhar feminista, falando dos filmes Câmara de Espelhos e Construindo Pontes. Contamos também com a ilustração da artista Lívia Viganó na nossa capa.
Vivemos tempos estranhos. Ano passado, enquanto organizávamos essa edição, vimos um grande veículo de mídia abrir espaço para que um general defenda uma nova intervenção militar, um banco cancelar uma exposição de temática queer e casos de incêndios criminosos em terreiros se multiplicarem pelo país. Enquanto isso, uma falsa simetria se alastrava entre trabalhadores do cinema, arte e cultura: a irresponsável e deliberada confusão entre “censura” e “lugar de fala”. São confusões que, ao contrário de possibilitar o dissenso, o diálogo e o desdobramento de questões complexas, criam um muro ao redor da questão por partirem de uma premissa falha. Os que historicamente não puderam exercer a autoridade de existir em imagens, sons e palavras construídas por sua própria subjetividade – que real poder de censura têm? Como disse Yasmin Thayná, “o incômodo por parte de quem sempre pôde falar me faz pensar que não querer entender a formulação desse debate é assumir que não quer estar no lugar de escuta”.
Que existam lugares em que se pode debater, discordar, ouvir, falar, existir e resistir e que o Verberenas possa ser um deles.
Amanda, Letícia e Glênis
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