Pensar em cinema, em especial no cinema brasileiro, sem que acabemos pensando também no desmantelamento de políticas públicas e culturais e nos sonhos e empregos de tantas pessoas, tem sido tarefa difícil. É desanimador, mas o desânimo é um sentimento que nos paralisa. Temos pensado, desde edições passadas, em como podemos nos mover.
O momento é desafiador, mas podemos e devemos continuar. Criamos e fazemos parte de um espaço do qual não podemos mais abrir mão, quaisquer que sejam as intempéries. Somos mulheres realizadoras, criadoras, pensadoras. Somos parte de uma rede que torna o “cinema” a soma dos filmes, da crítica, das curadorias, do público.
Nesta edição, nossas vozes dialogam a partir desses diversos lugares. Através da crítica de Manuela Andrade sobre Mala Junta, conhecemos o filme de uma diretora mapuche, Claudia Huaquimilla, que expõe a vulnerabilidade, mas também a resistência de seu povo no presente. O texto de Ana Julia Carvalheiro sobre o longa-metragem de animação da animadora e cartunista Nina Paley reflete sobre formas de amor e metamorfose. A cineasta Ana L. aqui fala do ponto de vista de uma empolgada espectadora sobre Fabiana, de Brunna Laboissière, e sobre a emoção de ver uma mulher cair na estrada. Glênis entrega um texto confessional sobre filmes, comida e aprendizagens afetivas através da arte. Em outro texto, Glênis junto a Letícia, duas das editoras do Verberenas, escrevem um texto experimental a partir de uma conversa sobre o suingue e alteridade em Divino Amor, de Gabriel Mascaro. Em uma tradução inédita e autorizada para o português do texto A Criação da Mulher Millennial, publicamos a análise de Rebecca Liu a partir dos contextos americanos e britânicos que influenciam o olhar cultural hegemônico e estabelecem uma mulher específica como voz de uma geração. Já Patrícia Ferreira Pará Yxapy e Sophia Pinheiro escrevem sobre o filme que realizaram juntas, Teko Haxy – ser imperfeita, e nos revelam com delicadeza as possibilidades de conexão entre uma mulher branca e uma mulher indígena. A capa dessa edição, Jaexá va’e jo hete re – O corpo que enxergamos (2017), também é de autoria de Patrícia Ferreira Pará Yxapy e Sophia Pinheiro.
Em comum, as críticas e ensaios desta edição direcionam nosso olhar para uma conexão possível, ainda que diante de variados abismos. Frente ao desafio de viver o presente, escolhemos continuar nos relacionando. Isso inclui evitar armadilhas totalizantes e universais, tanto quanto reconhecer na falha uma subjetividade também valorosa. Quando e como pudermos, continuaremos a nos mover, entre imagens, sons e palavras, em busca do mundo em que queremos viver.
Editoras
Letícia, Amanda e Glênis