Nunca pensei em ser cineasta. Mesmo tendo crescido fascinada por imagens, sobretudo pela televisão, até eu entrar na faculdade nunca havia passado pela minha cabeça a possibilidade de trabalhar com cinema. Apesar de meus pais terem um amigo próximo cineasta, durante meus anos de formação escolar essa era a única referência de alguém de uma realidade parecida com a minha que fazia parte do “mundo mágico” do cinema. Nunca soube de nenhuma mulher, muito menos uma mulher negra, que tivesse alcançado esse status.
Não pretendo falar da minha trajetória dessa vez, gostaria de falar sobre possibilidades, sobretudo a possibilidade de transformar realidades através da invenção. Acredito que muito da crença na possibilidade de mudança vem daquela sensação de identificar em outras experiências caminhos que as tornem palpáveis, quase como: “hum… bom, se fulana conseguiu, eu também consigo”. E no caso de uma menina negra da zona leste de São Paulo conhecer a trajetória de outras mulheres negras pobres que ousaram fazer filmes é manter a fé de que pode ser possível transformar realidades, nem que seja inventando nas telas novas formas de viver. Não ignoro as dificuldades materiais, nem as urgências do cotidiano que nos impedem de nos dedicarmos ao cinema, mas acredito que alimentar nossos sonhos é uma forma de alimentar nossas existências.
E aí que eu escrevo esse texto para você, jovem negra com poucos recursos, mas cheia de sonhos. E parto da experiência de uma cineasta, mulher, negra, pobre e muito ousada, mas também invisibilizada pelo racismo e machismo da cinematografia brasileira: Adélia Sampaio. Nascida em Minas Gerais, filha de empregada doméstica, Adélia foi a primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no Brasil, mas seu filme Amor Maldito, lançado em 1984, ficou quase trinta anos num ostracismo revelador das estruturas que sustentam o mundo das artes brasileiras.
Amor Maldito foi o título de uma reportagem do jornal carioca O Fluminense publicado no início dos anos 1980. A crônica jornalística trazia um caso que aconteceu no bairro de Jacarepaguá, Rio de Janeiro, e narrava a história de duas mulheres lésbicas que haviam tido um relacionamento, e após seu fim, uma delas havia se suicidado. Entretanto, a ex-companheira da falecida foi acusada de assassinato e o caso levado a tribunal. O longa-metragem de Adélia, inspirado nesse acontecimento, narra a partir do julgamento de Fernanda (Monique Lafond), sua relação com a ex-companheira Suely (Wilma Dias) e traça um retrato da justiça e da sociedade brasileira a partir de figuras caricatas, como a família evangélica de Suely e o advogado sensacionalista da acusação.
Estamos falando de um filme produzido nos anos 1980 e pensar a trajetória de Amor Maldito nos convida a refletir sobre sexualidade, gênero e raça no contexto do cinema brasileiro e seus diálogos. Amor Maldito pode ser visto como uma obra à frente do seu tempo, mas tanto a escolha certeira em sua abordagem temática quanto as questões ligadas a sua produção e distribuição marcam o retrato social de uma época: anos de ditadura militar, conservadorismo político e moral, e estruturas que mantém as desigualdades de gênero e raça. O filme teve de ser “fantasiado” de pornô para conseguir alguma visibilidade, e ganhou mais destaque pela atmosfera sexual que o rodeava, do que pelo debate que propunha, tendo seu conteúdo praticamente ignorado tanto pelo público, quanto pela crítica.
Numa breve historiografia do cinema nacional, podemos reparar nas dinâmicas, muitas vezes homofóbicas, que marcaram as construções narrativas em torno das vivências das pessoas LGBTs. Na época das chanchadas, populares nos anos 1940 e 1950, personagens homossexuais homens foram majoritariamente representados como estereótipos de gays afeminados, servindo à narrativa como alívio cômico ou travestidos de forma assexuada. Dessa forma ficava mais tragável para o público a aceitação desses personagens, pois suas subjetividades não eram postas na narrativa. A temática também foi deixada de lado pelo cinema novo, que preferia discussões sobre classes sociais, e encontrou um pouco mais de penetração no cinema marginal. Foi a partir dele que personagens homossexuais começaram a ocupar papéis centrais nas narrativas, ainda que ligando a homossexualidade à marginalidade.
A temática lésbica, entretanto, ganhou apelo nos filmes da pornochanchada, que valorizava o desejo e a curiosidade do homem heterossexual, trazendo personagens com pouca ou nenhuma afetividade e complexidade. O lesbianismo era apenas um estágio na história pela qual a mocinha passava para levá-la a ficar com um homem. Além da falta de sutileza com a qual era inserida, normalmente a “lésbica real” da história — a corruptora da mocinha — se torna uma assassina, serial killer, ou seja, o verdadeiro obstáculo a ser combatido. Um exemplo dessa representação pejorativa é encontrada em As Intimidades de Analu e Fernanda (1980), de José Mizziara, com atuação de Monique Lafond.
Monique Lafond foi atriz de diversos filmes pornôs e viveu a personagem Fernanda em Amor Maldito, a executiva acusada do assassinato de sua ex-companheira. Já Wilma Dias, que interpretou Suely, era a “garota da banana” que aparecia na abertura do programa Planeta dos Homens (1976), da TV Globo, cuja imagem tinha um forte apelo sexual. Na busca por reportagens, notícias e críticas sobre o longa de Adélia foram encontradas menções ao filme quando vinculados às suas atrizes. O que chamava atenção para Amor Maldito era a atmosfera sexual que o rodeava, mais do que a visão crítica que da sociedade brasileira e de como ela condenava as relações homossexuais na época.
Amor Maldito é um dos filmes que aborda o lesbianismo de forma mais positiva na produção nacional, sendo um retrato social da época. Inovou não na linguagem, mas na abordagem sensível e crítica de uma temática marginalizada, porém a dificuldade em sua distribuição – atrelada ao preconceito homofóbico e as barreiras impostas a uma mulher negra – não o tornou conhecido do grande público. À época de sua produção, a Embrafilme era a empresa responsável pela regulação das políticas públicas e incentivos financeiros para a produção e circulação de filmes nacionais. Dentro do contexto político e social da ditadura militar e do forte conservadorismo no que diz respeito às relações sexuais, a empresa chegou a reduzir o orçamento da produção até chegar a zero, afirmando que não compactuava com uma obra que perpetuasse e fosse vista como panfletagem de uma “doença”. Em busca de alternativas para produção, Adélia liderou um sistema de cooperativa, prática muito comum no teatro (onde ela trabalhou durante anos) para que o filme tomasse corpo.
No Brasil, quando da exibição de Amor Maldito em salas de cinema, o filme foi recusado por diversos exibidores que se negavam a dar espaço para esse tipo de debate. Até que o longa foi apresentado a um exibidor, conhecido como Magalhães, que se interessou pelo tema e viu nele a oportunidade de circulação desde que fosse vendido como filme pornô. E foi assim que Amor Maldito estreou na Galeria Olido, em São Paulo, em 13 de maio de 1984, em meio programações de filmes pornôs e cartazes sexualmente apelativos.
Mesmo que suas opções estéticas gerem controvérsias, principalmente devido às encenações exageradas e caricatas, o filme é bastante ousado e bem-intencionado, mas no meio da pornochanchada, não há espaço para boas intenções. Amor Maldito foi visto à época de seu lançamento como um intermediário entre uma obra-prima e as concessões aos apelos eróticos, o que o fez ficar sem público. O filme pouco tem desse apelo, na verdade: Adélia busca explicar a bestialidade que enreda a patética mitologia do sexo descartável, e oferece uma antologia de sexo com sentimentos de culpa.
“Só uma cineasta ousada é capaz de tornar reais coisas que a sociedade condena, como o casamento de Monique e Vilma”. Essa foi a descrição usada por Ailton Assis em sua crítica sobre Amor Maldito publicada na Tribuna da Imprensa de 1983. E Adélia é de fato uma vanguardista, uma cineasta sensível a temas marginalizados socialmente. Durante sua carreira esteve envolvida com outros temas das minorias representativas, e atrás das câmeras contava com presença massiva de mulheres em sua equipe. Antes de dirigir Amor Maldito, a cineasta já havia produzido dezenas de filmes do cinema novo e marginal, mas um episódio significativo de seu trabalho e que diz muito sobre as relações raciais no cinema brasileiro chama atenção: a presença do filme Parceiros da Aventura de José Medeiros no Festival de Gramado em 1980 que ficou conhecido como o “filme dos negrinhos”. Na ocasião, Adélia atuou como diretora de produção do filme, que apesar de ter chamado grande atenção do público, esbarrou na resistência racista dos jurados do festival, que não o premiaram por considerá-lo negro demais.
É essa resistência racista, em reconhecer o trabalho de artistas negros em prol da manutenção de uma estrutura que enaltece a produção de cineastas brancos, um dos fatores que influenciou o ostracismo no qual caíram Adélia e seu filme. O papel da Embrafilme, por exemplo, foi fundamental para os caminhos que levaram Adélia ao esquecimento. Enquanto seu filme não recebia apoio nenhum, filme dirigidos por homens brancos cujas temáticas favoreciam a manutenção do status quo recebiam financiamento e apoio para distribuição (cenário que não é completamente diferente de hoje, mas isso é assunto para um outro texto). Assim, eu questiono: Terá sido só a temática que fez de Amor Maldito um filme esquecido pelo público e crítica? Como esse mesmo público e crítica olharam para um filme dirigido por uma mulher negra nos anos 1980? E como esses olhares moldaram sua trajetória?
Talvez a trajetória de Amor Maldito tivesse terminado aí, se não fosse sua redescoberta no começo dos anos 2010, por outra mulher negra. Em 2013, Edileuza Penha de Souza realizou tese de doutorado pela Universidade de Brasília chamada Cinema na Panela de Barro: Mulheres Negras, Narrativas de Amor, Afeto e Intimidade. Ainda que esse não seja o foco da tese, a pesquisadora propõe uma discussão acerca do que é conceitualmente o Cinema Negro e faz um levantamento dos realizadores e realizadoras negras do cinema nacional, citando o pioneirismo de Adélia Sampaio.
A tese de Edileuza faz parte de um contexto maior de estudos e políticas afirmativas e identitárias que conquistaram espaço público no Brasil com mais força a partir dos anos 2000. Fruto das mobilizações sociais do movimento negro, organizado no Brasil desde os anos 1970, a implementação de uma política de cotas raciais nas universidades e órgãos públicos brasileiras tem mudado não só a composição racial dos cursos, mas tem transformado a produção de conhecimento com o surgimento de trabalhos nas mais diversas áreas, que tratam das relações raciais e de gênero a partir da perspectiva dos sujeitos negros. Este é um movimento que tem ganhado corpo no Brasil, em diálogo com outros países da diáspora africana, e encontrado reverberações na cultura digital, na política e também nas artes.
Desde que a figura de Adélia ressurgiu na pesquisa de Edileuza e foi difundida, sobretudo entre realizadores, curadores, militantes e pesquisadores negros, uma nova reescritura da história do cinema nacional tem sido proposta, sobretudo pelas mulheres negras. De 2015 para cá, Adélia Sampaio e Amor Maldito circularam pelo país num movimento de reconhecimento do trabalho de uma cineasta, mulher e negra, que foi propositalmente deixado de lado durante tantos anos. As reivindicações pelo reconhecimento do cinema feito por mulheres negras no Brasil tem pipocado, sobretudo desde 2016, e nos feito questionar, repensar e mover certas estruturas.
A redescoberta do filme acaba por escancarar a necessidade de reescrever a história desse cinema e está fortemente ligada aos movimentos organizados por pessoas negras. O reconhecimento do pioneirismo de Adélia traz à luz a discussão sobre os processos de invisibilidade das pessoas negras na sociedade brasileira, sobretudo em espaços tão elitizados quanto o cinema, e nos faz refletir sobre a influência dos debates públicos atuais na repercussão dos filmes. Mas, acima de tudo, destaca a necessidade de construção de um ambiente de possibilidades para que outras mulheres negras, como eu e você, enxerguemos no fazer cinema uma alternativa para inventar novas formas de viver e transformar as realidades que nos cercam.
Alejandro Jodorowsky e sua obra são comumente celebrados em um espaço difícil de definir. Por vezes negligenciados pelos críticos por não se encaixarem em nenhuma tradição cinematográfica, ao mesmo tempo foram cultuados por entusiastas da contracultura hippie dos anos 1970 e envolvidos em certo tom obscuro e alternativo. Seus filmes também ganharam a pecha de head film, ou seja, filmes para serem assistidos enquanto se usa drogas.
Diante desse cenário, o assunto Jodorowsky envolve uma certa aura progressista. Entretanto, o diretor sempre se orgulhou de se abster de comentários políticos, argumentando que seus interesses estavam em revoluções espirituais e pessoais. Há controvérsias sobre essa suposta oposição entre política e espiritualidade, a expectativa de que arte possa transcender comentário político.
Gostaria de começar falando sobre Mara Lorenzio.
Lorenzio foi a atriz principal do segundo filme do diretor, El Topo (1970), que conquistou as graças de John Lennon e teve os direitos de distribuição adquiridos por Allen Klein, agente dos Beatles. O filme inaugurou o fenômeno do midnight movie nos Estados Unidos – filmes produzidos fora de Hollywood e exibidos em pequenos teatros à meia-noite.
Em uma entrevista concedida em 1970, Jodorowsky declarou ter “realmente” estuprado Lorenzio durante a gravação de uma das cenas de estupro de El Topo. Mas, ao contrário do caso de Maria Schneider e O último tango em Paris, não conhecemos a versão da história de Mara – a atriz desapareceu da cena artística após o lançamento do filme.
O que sabemos de Lorenzio é o que Jodorowsky nos conta. De acordo com o diretor, ela simplesmente “apareceu” na casa dele um dia: “Ela estava mal. Em um momento da vida dela ela havia tomado LSD em grandes quantidades e tinha sofrido. Ela estivera em um hospital para doenças mentais”. Jodorowsky convidou a desconhecida para atuar no filme, e ela se mudou para a casa dele, onde ficou por seis meses. Depois que El Topo foi gravado, Lorenzio foi embora e os dois nunca mais se viram.
Jodorowsky, porém, não é exatamente um narrador confiável. Entrevistas com o diretor são menos sobre fatos e mais sobre a mitologia pessoal que ele deseja criar. Jodorowsky declara não querer ser visto apenas como um cineasta, mas como um profeta: seus filmes não são só obras de arte, são um caminho para alcançar a iluminação; a equipe é composta por guerreiros espirituais que serão transformados. Suas respostas são temperadas por referências místicas e improvisações: “Quando eu falo, eu invento. Eu invento. Eu nunca penso sobre o que falo”. Isso dificulta ainda mais a entender o que realmente aconteceu.
Embora ele declare ter morado com Lorenzio por seis meses e saber detalhes sobre a saúde mental dela, em outro momento da mesma entrevista de 1970 ele afirma que “não sabia nada” sobre ela e que eles “nunca conversavam” um com o outro. Anos mais tarde, em 2007, Jodorowsky afirmou para a revista britânica Empire: “Eu não estuprei Mara, mas eu a penetrei com o consentimento dela”.
Enquanto é incerto se realmente ocorreu um estupro no set devido à ausência do depoimento de Lorenzio, podemos ter certeza de que Jodorowsky não via problemas em estuprar uma atriz para “fins artísticos”. Inclusive, o estupro é uma forma de afirmar a imagem de líder espiritual a qual o diretor almeja. Veja bem: para ele, o estupro não é um ato de violência, um crime. Jodorowsky defende que estuprar uma mulher é um modo de despertá-la criativamente. É essa a narrativa que ele constrói, tanto para a atriz quanto para a personagem. Em El Topo, o estupro é uma forma de curar a frigidez feminina e despertar o orgasmo:
“Então ela [Mara Lorenzio, a atriz] me disse que já havia sido estuprada antes. Veja você, para mim a personagem é frígida até El Topo estuprá-la. E ela tem um orgasmo. É por isso que mostro um falo de pedra que jorra água nessa cena. Ela tem um orgasmo. Ela aceita o sexo masculino. E é o que aconteceu com Mara na vida real. Ela realmente tinha esse problema. Uma cena fantástica. Uma cena muito, muito forte.”
Mara, em El Topo, é resgatada pelo personagem principal do jugo de um coronel. Em seguida, o casal atravessa o deserto. Enquanto El Topo é capaz de fazer pequenos milagres, como encontrar ovos em meio a areia e fazer água jorrar de pedras, ela se compara com ele e se frustra com a própria incapacidade. Até que El Topo a estupra, e então ela ganha as mesmas habilidades mágicas. Mais adiante, a personagem de Lorenzio irá traí-lo com outra mulher e abandoná-lo.
O diretor repete a associação entre estupro e criatividade no documentário Duna de Jodorowsky: “Quando você faz um filme, você não deve respeitar o livro. É como quando você se casa, não? Você toma a mulher. Se você respeitar a mulher, você nunca vai ter um filho. Você precisa abrir o vestido e estuprar a noiva. E então você vai ter o seu filme. Eu estava estuprando Frank Herbert [autor do livro original Duna], mas com amor, com amor”.
Na entrevista concedida em 1970, Jodorowsky elabora mais teorias sobre a sexualidade feminina. Segundo o diretor, matar coelhos seria mais satisfatório para um homem do que fazer sexo, já que os animais se entregariam à morte mais facilmente do que uma mulher ao orgasmo: “A vingança da mulher contemporânea é fazer o homem se esforçar para dar-lhe um orgasmo”.
El Topo contém mais duas cenas de estupro. Em uma delas, vemos mulheres brancas, velhas, ricas e excessivamente maquiadas molestarem um homem negro escravizado e depois o acusarem de estupro. Por causa da falsa acusação, o escravo é assassinado pelos moradores revoltados da cidade. Embora falsas acusações de estupro de mulheres brancas por homens negros de fato ocorram, como no caso dos Scottsboro Boys, Jodorowsky parece atribuir a culpa do acontecimento às supostas hipocrisia sexual feminina e volúpia exacerbada de mulheres velhas e feias, enquanto o verdadeiro culpado é o racismo.¹
Na cena de estupro seguinte, El Topo e uma amiga, que tem nanismo, são forçados a fazerem sexo na frente dos clientes de um bordel. A personagem, referida no roteiro como A Pequena Mulher, o abraça apaixonadamente e diz: “Eu te amo. Eles não existem. Não há ninguém aqui além de você. Me possua. Por favor”. Jodorowsky imagina que a reação de uma mulher obrigada a fazer sexo em frente a uma plateia seria a de encarar a situação como um momento romântico e não, sei lá, um ato de violência. Aqui, o estupro poderia ser visto como uma oportunidade para a “mulher feia”, que de outra forma não conseguiria fazer sexo com o homem desejado. Quando questionado se havia feito sexo de verdade com a atriz nessa cena, Jodorowsky respondeu: “Não, porque eu não me sentia sexualmente atraído por ela”.
É curioso que uma visão tão tradicional sobre sexualidade feminina não tenha sido amplamente vista como um problema no trabalho de Jodorowsky.² Em um artigo de David Church para Senses of Cinema que analisa a obra do diretor, por exemplo, a cena de estupro em El Topo é descrita em poucas palavras: “El Topo a estupra para desencadear seu primeiro orgasmo”. Sem discussões ou ressalvas posteriores. Durante a entrevista de 1970, quando Jodorowsky confessa ter estuprado Lorenzio, o entrevistador, Ira Cohen, responde apenas: “Você sabia que a toupeira tem o pênis no formato de uma faca?”, e os dois seguem discutindo sobre o simbolismo de facas e ovos.
Jodorowksy costuma ser criticado pelo simbolismo hermético e pelas frases de efeito vagas, e não pelo fato de promover estupro como algo bom para mulheres. Se um diretor aspira a provocar uma revolução espiritual e inspirar pessoas com seu trabalho, o fato de sua obra promover a manutenção de ideias conservadoras e nocivas sobre gênero não deveria ser visto como uma falha, ou ao menos um ponto relevante a ser discutido?
Notas:
(1) O homem negro é caracterizado pelo racismo como violento, hiperssexual e uma ameaça à sociedade. Isso faz com que ele sirva de bode expiatório para a violência de homens brancos, que se revestem com ares de inocência e respeitabilidade enquanto acusam negros de serem os verdadeiros estupradores. O mito do homem negro como estuprador de mulheres brancas também tem a função de impedir a miscigenação racial após a abolição da escravidão. Com medo de serem estupradas, mulheres brancas passam a evitar interações com homens negros, conforme explica bell hooks no livro Ain’t I a Woman.
(2) Uma das exceções a essa observação seria a crítica Pauline Kael. Responsável por cunhar o termo “acid western” ao descrever El Topo, Kael argumentou que o filme se revestia com uma imagem subversiva por meio do sincretismo de símbolos religiosos, mas que a mensagem, por fim, acabava sendo tradicionalíssima: “Um homem divino tentado por uma mulher má e sedenta por poder abandona a integridade, e então, pelo amor de uma boa mulher, se torna um homem espiritual, apenas para aprender que o mundo não está pronto para sua espiritualidade”.
por Amanda V.
Amanda escreve no Deixadebanca e também organiza o Xotanás, sobre masturbação feminina.
Podemos pensar a dramaturgia de Mãe Só Há Uma (2016), de Anna Muylaert, a partir de duas chaves iniciais de aproximação: a primeira é ter uma trama livremente inspirada no caso Pedrinho – o bebê raptado em uma maternidade em Brasília, em 1986; a segunda é a construção identitária do protagonista – o adolescente de 17 anos, Pierre/Felipe (Naomi Nero).
Apesar de tomar como ponto de partida um evento real, o longa não pretende se vincular a uma tradição de gênero “inspirado em fatos reais” – tanto que há uma recusa do uso de qualquer cartela explicativa/informativa sobre o caso Pedrinho. O real aqui não é apreendido como um tour de force, mas como motivador de narrativas possíveis, que inclusive jamais se deixam seduzir pela espetacularização dos pormenores do caso.
No entanto, seguindo o mesmo procedimento de Que Horas Ela Volta?, parece ainda ser inevitável à Muylaert – e, em alguma medida, até escorregadia – a tendência em reforçar o estereótipo do modo de vida da classe média. Isso é feito a partir de componentes cômicos, como a sequência da reunião com a família para tirar um selfie ou a cena em que pais biológicos sugerem uma viagem à Disney.
O filme ganha outros matizes quando se detém no protagonista Pierre/Felipe: um jovem de gênero fluido, que está experimentando as diferentes possibilidades de vivência da sexualidade, durante sua formação na adolescência. De certa forma, ele se assemelha à protagonista de Tomboy (2011), da cineasta francesa Céline Sciamma, que ganhou o prêmio Teddy há cinco anos, em Berlim, tal como Mãe Só Há Uma conquistou em 2016. Os dois filmes não só tratam do gênero pelo viés da performatividade, como também reposicionam a temática dentro do universo da infância e da adolescência, que são intransponíveis ao mundo adulto.
Em Tomboy, Laure é uma menina de 10 anos, que se apresenta como Michael para um grupo de amigos vizinhos. Ela se veste como garoto e procura se adequar aos códigos de comportamento que são esperados socialmente de um menino. Em Mãe Só Há Uma, Pierre/Felipe também vai subvertendo aos poucos os códigos que lhe são imputados: ele passa a usar vestido, batom vermelho, calcinha com cinta liga. Em ambos os filmes não há posicionamentos fechados em relação à sexualidade dos dois personagens, mas uma abertura aos cruzamentos performativos entre gêneros.
Afetada por um corpo em formação, em estado transitório, a câmera de Mãe Só Há Uma quase tateia a pele de Pierre/Felipe. Em especial nos momentos em que ele se observa diante do espelho e nas cenas em que ele se sente mais livre, nas festas noturnas ou nos ensaios com sua banda de rock.
É fundamental a mudança de operação estética da imagem, orquestrada pela fotógrafa uruguaia Barbara Alvarez. Ela se arriscou mais aqui pela fluidez formal do que no longa anterior de Muylaert, Que Horas Ela Volta?, filme enrijecido pelo rigor da composição do quadro, capaz de sublinhar as relações de poder no ambiente de trabalho da empregada doméstica Val (Regina Casé).
Apesar das motivações serem completamente distintas, é possível encontrar ressonâncias entre Pierre/Felipe, de Mãe Só Há Uma, e a Jéssica (Camila Márdila), de Que Horas Ela Volta?, na medida em que ambos os personagens desestabilizam a ordem de uma cena constituída de onde eles não pertencem. No caso de Pierre/Felipe, a casa dos pais biológicos, que insistem no bom comportamento do jovem como o filho ideal, principalmente o pai conservador Matheus (Matheus Nachtergaele). No caso de Jéssica, a casa dos patrões de sua mãe empregada, com todas as regras tácitas de uma vida burguesa.
Ao longo da narrativa, o filme nos entrega um segundo protagonista: o irmão biológico caçula Joca (Daniel Botelho), que enfrenta conflitos amorosos na sua pré-adolescência e demonstra certo desconforto com o comportamento de sua família tradicional. Se de início existe uma distância natural entre Pierre/Felipe e Joca, os dois irão se aproximar por essa sensação de deslocamento. A direção de Muylaert tem a perspicácia de não anunciar isso logo de imediato, de ir compondo aos poucos, dando grandeza a um personagem que até então parecia ser secundário.
Outra estratégia importante da direção é ter dado a uma só atriz (Dani Nefussi) o papel das duas mães: Aracy, a mãe que criou, e Glória, a mãe biológica. Ainda que o espectador não perceba (até porque a excelente caracterização das personagens procura deixá-las bem distintas), é algo que redimensiona literal e psicanaliticamente o título para além do ditado popular de que “mãe só há uma”. Estamos novamente diante de um filme de/sobre mãe, mas agora acalentado pela perspectiva de um filho que se descobre, ao mesmo tempo em que conhece seu próprio mundo.
Cartão Vermelho (1994) foi o primeiro curta-metragem de Laís Bodanzky (diretora dos longas As melhores coisas do mundo e Bicho de sete cabeças) e é um dos filmes nacionais que tratam sobre questões de gênero e relações de poder calcadas no machismo dentro do período infantil. A cineasta conta uma história composta por pré-adolescentes focando especialmente em Fernanda: o sonho dela é se tornar uma estrela do futebol brasileiro, como o Zico, ídolo da garota. Em um mundo estritamente masculino, ela não possui a “força física”, mas subverte o seu poder através da inteligência: Fernanda sabe da fraqueza masculina e se aproveita disso durante o jogo, sua mira é impecável e a bola, inevitavelmente, acaba sempre entre as pernas dos meninos. Cansados de serem acertados, os garotos decidem se vingar e daí vem toda a problemática da discussão.
Primeiro, é preciso observar o contexto em que o filme foi feito. Em 1994, menina em jogo de futebol no Brasil era um tabu muito maior do que hoje, as discussões sobre gênero eram menos problematizadas e já por esta temática, Cartão Vermelho trata de um assunto fora dos padrões da época. Além disso, a cena da vingança gera um incômodo: os meninos querem descobrir o que há por debaixo das “saias” de Fernanda. Neste ponto, a sexualidade entra como um segredo e também enquanto ponto fraco de “ser menina”. Eles a encurralam em um esconderijo e levantam sua roupa a força. A sensação é de agonia. Sentimos medo por Fernanda. Um dos garotos, após observar os órgãos genitais da menina, os desenha em uma parede explicando cada parte da vulva e da vagina, em uma espécie de cientificismo – a ciência fria e seca estaria ligada à masculinidade?
Após a explicação científica, um dos garotos continua a desenhar transformando a figura da vagina em um campo de futebol. O campo de futebol aparece, então, enquanto um campo de batalha para Fernanda. Nele, a garota se encontra, ela se identifica como atuante, protagonista, alguém que sabe o que quer e age em prol de sua vontade. Entretanto, por ser a única menina, o futebol significa também um jogo de poder, onde ela precisa negociar para existir. O curta-metragem problematiza ainda mais a temática ao inserir na narrativa aspectos como afeição e sexualidade. Afinal, é durante a pré-adolescência e a adolescência que acontecem as primeiras experiências afetivas e sexuais.
A montagem evidencia o aspecto desta época de transição. O filme é permeado por jumpcuts (cortes entre um mesmo plano), principalmente durante a movimentação de Fernanda, ao correr ou andar de bicicleta. A trilha que acompanha estas cenas é um rock e torna as sequências bem “divertidas”, elevando o aspecto moleca de Fernanda. Em contraposição, em cenas onde a garota se encontra reflexiva, ou sonhando, ou mesmo pensando em um garoto, os planos são próximos, sem trilha, a busca é por uma sensação de interioridade.
Apesar de perceber Cartão Vermelho como uma produção crítica, o curta incomodou alguns colegas que assistiram ao filme comigo, a percepção é de que haveria uma romantização da violência sexual. Isto porque, após a cena da vingança, Fernanda volta a jogar futebol como se nada tivesse acontecido, ela amarra o cadarço nas calças – uma analogia aos soldados de guerra – e entra em campo. Durante o jogo, a menina acerta a bola em Daniel, garoto que em uma das cenas comemora um gol com ela. Há uma espécie de afeição entre os dois e até então Fernanda nunca havia chutado em cima dele. O mesmo garoto aparece como “líder” do grupo, foi ele quem comandou a emboscada contra a menina. Após ter sido acertado, Daniel diz: “Deixa comigo, eu cuido”. No último plano, vemos um riso de Fernanda e assim acaba o filme.
A sequência trouxe a discussão: o curta faz uma apologia ou não a violência de gênero? Ao meu ver, apologia não. Mas coloca uma série de intercessões temáticas. Fernanda sente atração por um amigo. Ela é a única menina no grupo, sua forma de defesa é agressiva. O menino em questão é o mesmo que comanda a vingança contra Fernanda – e para isto utiliza a “união masculina” como força motriz. A sexualidade feminina é colocada enquanto segredo a ser desvendado pelos garotos. De qualquer forma, eles não podem responder as suas curiosidades por meio da afeição ou do diálogo, mas apenas pela força, pelo poder e por que não pela ciência? Já que sempre disseram que homens e mulheres têm capacidades diferentes. Todavia, Fernanda joga “como um menino”, não é mesmo? É por este motivo que os garotos ficam também tão aflitos e instigados com sua presença.
Para finalizar, Cartão Vermelho trata de um turbilhão de assuntos em menos de 15 min, são tantos os temas: a descoberta da sexualidade, relações de poder, machismo e resistência – acho que seria muito pouco traduzir o filme em “romantização da violência” – na verdade, penso que o curta questiona sobre essa romantização sob vários pontos de vista. Ela pode até ter acontecido, mas o discurso do filme não endossa a “prática” como aceitável. O resultado é um fluxo de pensamentos na cabeça do espectador.
O riso final de Fernanda é, para mim, espécie de subversão. O riso por si só é subversivo. Fernanda não ri de boba, ela ri como esperta, um riso de canto de boca. A montagem, que antes separava claramente, a Fernanda moleca da Fernanda reflexiva, em uma das últimas cenas parece juntar as duas. Ao trazer em plano próximo o rosto da menina que literalmente encara de frente mais um jogo de futebol, dessa vez o plano é acompanhado de trilha. O curta termina de forma aberta, não sabemos o que vai acontecer e isso dá margem para muitas análises.
Existe algo sobre histórias de formação que mexe com as emoções do público. Talvez tenha algo a ver com o fato de que qualquer adulto tenha que passar pela experiência de alcançar a maturidade, o que faz das obras que exploram o tema especialmente tocantes e identificáveis. A universalidade das histórias de formação faz delas um assunto explorado repetidas vezes, mas, como de costume, as obras mais celebradas do gênero são protagonizadas garotos brancos tendo que lidar com a chegada da vida adulta. Não que Holden Caulfield não seja um personagem memorável, sua tentativa de fuga do mundo dos adultos é algo com que muitos podem se identificar, mas não podemos fingir que a sua experiência não está profundamente ligada ao seu sexo, cor e status social. Temos que parar de fingir que homens brancos heterossexuais são um padrão em que todos podem se ver. É verdade que pessoas de grupos minoritários – mulheres, negros, asiáticos, gays – acabam por ter que se identificar com ou no mínimo conhecer essas histórias simplesmente porque elas estão em todos os lugares e formam o cânone da arte ocidental. Mulheres que estudam e se interessam por literatura são obrigadas a ler livros de autores celebrados que eram extremamente misóginos. Cineastas negros têm que saber que O Nascimento de Uma Nação, um dos filmes que marcaram o cinema, glorifica a criação da Ku Klux Klan. Estudar arte, pertencendo a um grupo minoritário, é, muitas vezes, uma experiência masoquista. E isso não começa com os livros e filmes racistas, misóginos e homofóbicos, vem de algo muito mais sutil e insidioso, da experiência de sermos forçados a nos identificar homens brancos e heterossexuais enquanto continuamos a ser desumanizados pela nossa invisibilidade. Essa lista vem como uma tentativa de abrir horizontes, mostrar novas histórias, dizer: estamos aqui. Existimos.
Os médicos olharam pras minhas pernas e disseram ‘não doeu? Não doeu tanto quando você estava fazendo que queimava respirar?’ Pelo menos elas me lembram que eu sobrevivi. Mas por pouco.
Depois de passar quatro meses numa clínica de recuperação após uma tentativa de suicídio, Rae tem que voltar a conviver com os amigos e a mãe ao mesmo tempo que lida com seus problemas de auto-imagem, depressão e ansiedade. A série trata de diversos assuntos que haviam sido explorados de forma muito tímida por outras séries adolescentes anteriores. A obesidade e o aborto são temas abordados com sensibilidade e consciência, promovendo um debate pertinente e muito honesto. Sem falar da forma sarcástica, cômica e crua que Rae vê o mundo, ela é um presente para espectadores que desejavam uma voz inovadora, engraçada e real.
Deve ser ótimo saber o que você quer fazer. Eu não faço a mínima ideia, só vou de um dia pro outro.
É seu último ano do ensino fundamental e Shizuku está pronta pra aproveitar o verão e ler todos os livros de fantasia que encontrar na biblioteca. Não demora muito pra ela perceber que todos os livros que ela pega foram lido antes por um tal Seiji Amasawa, que ela acaba por conhecer e, aos trancos e barrancos, se tornar amiga. Ao descobrir sobre o desejo de Seiji de seguir sua paixão pela confecção de violinos, Shizuku é inspirada a pensar em seus próprios desejos para o futuro e descobrir suas próprias aspirações: tornar-se escritora. Apesar de seus medos e incertezas, Shizuku se entrega completamente à empreitada de escrever sua primeira história, por vezes negligenciando a escola, o que preocupa seus pais. Whisper of the Heart apresenta comentários interessantes não só sobre a procura dos sonhos, mas também sobre o expectativas da sociedade japonesa quanto a escola e busca de carreiras criativas.
Você, tímida? Quem dera!
Tudo que a pequena e rebelde Wadjda quer é uma bicicleta verde para apostar corrida com o amigo e, depois da recusa da mãe, ela sabe que a única forma de alcançar seu objetivo é utilizar suas próprias habilidades para arrecadar dinheiro e comprar a bicicleta ela mesma. A trama do filme é simples e simbólica. Além de ter sido o primeiro longa-metragem inteiramente filmado na Arábia Saudita, O Sonho de Wadjda foi também o primeiro filme dirigido por uma mulher saudita, sua história aparentemente simples, protagonizadas por mulheres em uma sociedade misógina, mas que continuam a lutar pelos seus direitos e desejos como podem, ganha um aspecto de resistência quando colocado em uma perspectiva histórica.
Ah, Estela… Todo mundo tem problemas. É que a gente só repara nos nossos.
O primeiro longa-metragem de ficção de Marina Person conta a história de uma adolescente que sonha em fugir. Fugir de um país sob um governo ditatorial, fugir do pai tirânico, fugir da sua primeira menstruação, que, segundo o mundo, indicava que ela havia se tornado mulher. Ao som de The Cure, Paralamas do Sucesso e Joy Division, vemos Estela descobrir que aquele sangue quatro anos antes nada tinha a ver com se tornar mulher. Vemos sua jornada para a maturidade se desenrolar em livros, amores e desamores, a morte de uma pessoa querida e sua primeira experiência sexual.
As pessoas dizem o tempo todo que você deveria ser você mesmo, como se você mesmo fosse essa coisa definida, como uma torradeira. Como se você soubesse o que é.
Falar da história de maturação de Angela Chase é um tanto quando irônico porque ela nunca acabou. A série que ela protagonizou em meados da década de 90 nunca viu a luz da segunda temporada devido a sua baixa audiência, mas desde então a série ganhou legiões de fãs e se tornou um clássico cult. Isso provavelmente se deve ao fato que a série, até hoje, ressoa profundamente com o público adolescente devido a sinceridade da sua personagem principal, Angela, entre a angústia com o fim de antigas amizades, a criação de novos laços, problemas com os pais e paixonites adolescentes, vemos diversas reflexões de Angela que por vezes hilárias e comoventes e fazem de My So-Called Life uma série memorável.
Um coração partido se abre para o nascer do sol porque até a ferida é uma abertura e eu estou partida, eu estou aberta.
A adolescência é uma época difícil para qualquer um, mas pode ser especialmente dura para uma adolescente negra e lésbica encarando e abraçando a sua própria sexualidade dentro de uma família religiosa. Alike tem que lidar tanto com problemas corriqueiros da idade como brigas com a melhor amiga quanto a homofobia profundamente enraizada da mãe enquanto descobre sua própria identidade e percorre o caminho tortuoso para a vida adulta. Desde as roupas que usa até a pessoa por quem ela vem se apaixonar fazem parte de um processo de auto-aceitação e busca de pertencimento que culminam numa ruptura dolorosa e necessária com a família e a infância.
Para a maioria dos geeks, um dia ruim pode ser uma piada durante a aula, a ocasional pegadinha com sua comida e, no pior dos casos, levar uma surra dos atletas. Mas quando se mora nos Bottoms, um dia ruim é ser morto por acidente.
No seu último ano do ensino médio, Malcolm Adekanbi ainda está tentando conciliar a sua identidade como um aluno nota 10 com pretensões de entrar em Harvard com a forma que o mundo o vê: um jovem negro criado na periferia de Los Angeles por uma mãe solteira. Em meio a sua busca por fugir dos estereótipos e encontrar o seu lugar no mundo, ele alimenta sua obsessão por cultura hip hop dos anos 90 e toca com seus dois melhores amigos em uma banda punk. Depois de se envolver acidentalmente em uma briga de gangues, ele terá de lidar com tudo que faz parte da sua identidade, inclusive aquilo que ele rejeita.